domingo, 1 de fevereiro de 2009

O GUARDADOR DE CABRAS

Foto: Cabras - João de Matos

Era uma vez um rapazinho, de seu nome Manuel. Era o mais velho dos seis irmãos e os pais eram muito pobres. Nos tempos difíceis que corriam, tinham dificuldade na alimentação. O trabalho que havia era pouco e sazonal, e não havia dinheiro suficiente para alimentar os filhos. Durante a noite, os pais pensaram que o melhor seria o Manuel ir trabalhar. Mas como, se ainda era uma criança? Deram voltas ao sentido, a pensar que tipo de trabalho é que ele poderia fazer. Sempre é menos uma boca cá em casa. É para o bem dele.
- Não achas, Esperança?
- Ai homem, mas então o nosso Manuel….ainda tão pequenino…meu rico filho…
- Já sei, vai guardar cabras. Vai para ajuda do ti Inácio. Ainda ontem ouvi o Chico das Lebres dizer na taberna do Zé Diogo que o ti Inácio, que agora anda no Monte da Misericórdia, precisa lá dum “ajuda”. É bom homem e trata bem os ajudas. Pelo menos não lhes bate, como muitas bestas que por aí há. Vais ver que também vai tratar bem o nosso Manuel. Não chores mulher. Deixa lá…
- Deus queira que sim. Eu também acho. Ele é boa pessoa. Achas que o ti Inácio quer lá o nosso Manuel? E a escola? O nosso filho já não vai à escola?
- Ó mulher, deixa lá a escola, porque primeiro está a barriga. Quanto ao ti Inácio, vais ver … Que diabo, ele precisa lá dum “ajuda”. Vais ver… Amanhã vou falar com ele. E assim foi.
O pai do Manuel, logo ao romper do dia, dirigiu-se ao monte da Misericórdia para falar com o ti Inácio. Uma vez que ainda era cedo, encontrou-o no bardo das cabras. Estava mesmo a acabar de varrer o bardo, para sair com o gado para a pastagem. O bardo é constituído por feixes de arbustos como a esteva, aloendro, piorno e outro tipo de mato. É uma espécie de paliçada em forma de círculo e com uma entrada virada a nascente. Com a chegada da Primavera, o bardo é substituído por outros portáteis, constituídos por cancelas de ferro com cerca de três metros de comprimento por um metro de altura. Este tipo de bardo, é mudado de vez em quando, para melhor aproveitamento do estrume.
- Bom dia ti Inácio.
- Ó Joaquim, bom dia. Então homem, o que é que te trás por cá, assim tão cedo?
- Sabe o que é, ti Inácio. Tenho lá o meu Manuel, isto está mau…não há trabalho… não se ganha nada… nem dá para açorda…
- E então homem, desembucha.
- Ontem ouvi o Chico das Lebres dizer, lá taberna do Zé Diogo, que precisava cá dum ajuda e então olhe, vai daí, disse à minha Esperança, qu’isto era capaz de ser bom para o meu Manuel. E olhe, aqui estou, a ver se o ti Inácio cá mete o rapaz para seu ajuda. Você não o conhece, mas asseguro-lhe que não se arrepende. É um bom rapazinho.
- Ora essa! Joaquim. Não duvido. Basta tu dizeres e ser teu filho. Até vem mesmo a calhar. É que estou mesmo a precisar. Então quando é que o rapaz pode vir? Combinamos o dia e vem cá trazer o rapaz. Quando é que te dá jeito?
- Então está bem. No fim do mês, está certo? Isto são mais dois ou três dias, e entra a mês certo.
- Está combinado, vem cá trazer o rapaz. Já sabes qual é o ordenado? Claro, ainda não te disse. São setenta escudos. Sei que é pouco, mas é o que por aí se paga. Manda-lhe uma manta, que isto aqui à noite arrefece. Chega uma manta. Se tiver frio, tenho ali uma pele de ovelha, que sempre ajuda. É melhor do que uma manta, mas…uma manta, sempre é uma manta.
O Manuel tinha apenas dez anos. Não passava duma criança. Disse aos pais que não queria ir para o campo guardar cabras, tinha medo da noite e dos lobos. Queria antes brincar com os amigos. Queria jogar a bola e ir aos ninhos ver os passarinhos, ir para a ribeira nadar e ver os peixinhos.
- Mas os pais, com muita paciência, sabe-se lá o que lhe ia na alma, convenceram-no a ir.
Quando chegou o dia combinado com o ti Inácio, o pai foi levar o Manuel ao monte da Misericórdia, muito longe de casa, e logo na primeira noite dormiu numa choça, numa cama muito rudimentar, ao lado do cabreiro. No chão, estava estendida uma esteira de buinho. Era esta a sua cama, e tão pobre, que nem tinha lençóis. Era tudo muito áspero e frio, mas o pior que tudo, eram as muitas saudades dos irmãos e dos pais.
- Vá lá Manuel, levanta-te para ires ao monte buscar a açorda para o almoço.
Mas… ainda é de noite? Eu tenho medo.
- Medo? Qual quê, qual carapuça. Aqui não há medos e ninguém te faz mal. Vai lá. Olha vais aqui por aquela vereda que te ensinei ontem, vais sempre em frente, apanhas a estrada, andas mais um pouco e estás no monte. Vais ver que não é difícil. Tem cuidado, não te percas no caminho.
O Manuel, a muito custo, ainda cheio de sono, levantou-se, e depois de o cabreiro lhe ensinar o caminho, lá foi buscar a açorda.
Chegado ao monte, a cozinheira, perguntou-lhe como se chamava:
- Sou o Manuel.
- Então quantos anos tens Manuel?
- Tenho dez.
- Ah sim. Está bem Manuel. Então aqui tens o caldo da açorda. O ti Inácio tem lá pão, miga umas sopas e pronto. Tenham bom proveito. Tapou a marmita de esmalte azul, e disse-lhe:
- Vai Manuel, leva a açorda ao ti Inácio antes que arrefeça. Tem cuidado, vê lá não caias para não a entornares, que isto ainda é de noite.
O Manuel, saiu do monte, pela estrada de terra batida. Depois apanhou a vereda até ao curral das cabras e à choça onde o cabreiro o aguardava para o almoço ao romper do dia. Quando saiu do monte ainda era de noite. O Manuel, como tinha medo, de andar por caminhos que desconhecia e por ser ainda de noite, de tanto bandear a marmita, quando chegou junto do cabreiro, a açorda não tinha praticamente azeite. O que lhe valeu um grande reparo por parte do cabreiro, pois a açorda era só água. Por muitos dias se repetiu esta cena, até que o Manuel, se habituasse à sua nova vida e deixasse de ter medo de andar no campo, de noite sozinho, a ouvir o canto das corujas. Tudo lhe metia medo. Pudera, o rapazinho nunca tinha saído de casa.
Entretanto o Manuel ia crescendo, crescendo, até se fazer um jovem. Começou a pensar que aquela vida não lhe servia para ele. Queria uma vida melhor. Entretanto, foi trabalhar para outro lado. Arranjou outra profissão, onde não andasse de noite, e que tivesse outro futuro mais promissor.
O Manuel, trabalhava durante o dia e à noite ia estudar. Tirou um curso secundário, e matriculou-se na Universidade em Lisboa no curso de medicina. Queria ser médico. Entretanto apaixonou-se por uma colega, paixão essa que resultou num autêntico fracasso. O desgosto de amor foi tão grande, que deixou de ter cabeça para continuar a estudar, entregando-se ao rei Baco. O vinho tomou conta dele, tornando-o numa pessoa irascível. Nunca chegou a acabar o curso, embora lhe chamassem doutor, e regressou à sua aldeia. Tinha barba rala, alto, magro e pele trigueira, o que fazia dele uma figura típica da aldeia. De porte altivo, encarava com arrogância e desassombro qualquer pessoa, dando a impressão que nadava em dinheiro… Durante o dia, entrava várias vezes nas tabernas a matar o bicho. No fundo, era boa pessoa, nunca se esqueceu do seu passado e ajudava todos por igual, quer fosse rico ou pobre, não lhe cobrando um tostão. Vivia daquilo que lhe queriam dar.
- Deixe lá ver essa língua… e esse pulso. Isto está mau!
- Oh! Senhor doutor…não me diga que vou morrer!
- Não…mas anda lá perto, digo-lhe eu! E não me contradiga, ouviu bem? Você não sabe o que diz. O que é que comeu hoje?
- Ele, senhor doutor - Comeu uma torradinha com banha de porco e café… dizia a mulher, metendo-se na conversa.
- Cale-se. Não diga asneiras, você é como ele. Isso é lá coisa que se coma? Manteiga de porco ou banha de porco...isso é uma porcaria. Isso é lá comer de gente?
- Ai senhor doutor, não me diga que vou morrer.
- Ai senhor doutor, não me diga que o meu José vai morrer, meu Deus.
- Cale-se já disse. O seu marido não morre porque estou eu aqui. Fique descansada que não vai além para o cemitério, tenha a certeza disso.
- Veja como ele está vermelhinho, coitadinho do meu José. Está ardendo em febre! Meu pobre marido, coitadinho!
- Ardendo em febre? Você sabe lá o que diz. A febre, é coisa que se tenha assim sem mais nem menos. Você sabe lá o que é isso. Deixe-se de parvoíces, sua alma de marmelada. Você até me faz secar as goelas! Não tem pr’ai uma gota de vinho para me matar a sede que me tem feito com essas parvoíces que tem dito? Febre! A gente sempre ouve com cada uma a esta gente! Gente esta! …Venha daí esse vinho!
- Foi o meu filho, buscá-lo à taberna do Zé Diogo. Tenha paciência que o quartilho já vem.
- Mas diga lá senhor doutor, o que é que hei-de fazer ao meu José. Que está tão doente?
- O que lhe há-de fazer? Olhe, para começar deixe-se de lamúrias ao pé de mim. Que isso não lhe faz nada, só atrapalha. Ferre-lhe com uma cataplasma, aqui na boca do estômago, de mostarda e absinto; e à noite um escalda-pés de água quase a ferver, e obrigue-o a tomar um quartilho de vinho branco com mel bem quente. É preciso que ele sue que nem um cavalo, ouviu o que eu disse?
- Sim, senhor doutor.
- Venha de lá esse vinho, que está a perder qualidades e a sede a aumentar-me esta secura que tenho aqui no esófago. Você sabe o que é o esófago? Claro que não sabe, como é que pode saber se nunca estudou? E andam isto com os pés pelo chão. Não passa duma ignorantona. Deite lá aqui mais uma gota de vinho, e daqui a pouco passe lá pela minha casa para trazer uma galinha que ontem me deram. Faça uma canja pró seu marido, ele o que precisa é de comer.
- Ora, ora, senhor doutor mas isso é para o seu jantar.
- Deixe lá dessas palermices, que eu cá me desenrasco, ainda lá tenho pão e queijo.
- Deus o abençoe, senhor doutor…
- Sim, sim. Lérias e mais lérias. Adeus até amanhã.
- Sim, senhor doutor e faça o favor de me dizer quanto é que eu devo.
- Quanto me deve? Ora essa, não me deve nada! Vá brincar para outro lado. Não basta eu ter salvado o seu marido da morte, garanto-lhe eu sua pateta, e ainda você me quer pagar! Ora essa, então a minha ciência é coisa que qualquer badameco me pague? Ora esta hein?
Nunca cobrou um tostão pela sua clínica, fosse a quem fosse. Se os seus remédios não salvavam, também não matavam, limitando-se na maioria dos casos a fazer transpirar o doente. Todos gostavam do Manuel a quem chamavam doutor. Fosse rico ou pobre, todos se serviam dos seus serviços, achavam graça ao seu mau génio e à sua arrogância, mas apreciavam-lhe as boas qualidades humanas.
Luís de Matos

AS BOLETAS DO VELHO GASPARÃO

Foto: Luís de Matos
Conta-se que um dia, já ao escurecer, no inicio de uma noite de Inverno, o ti Gaspar, mais conhecido por velho Gasparão, sem qualquer tipo de ofensa, Deus me livre, mas era assim que a garotada e até os mais velhos o tratavam, pois sempre ouvi tratarem o Ti Gaspar daquela maneira, quando se dirigia para casa, apanhou umas boletas na Vila Velha e vá de as meter nas mangas da jaqueta. Encheu as mangas e atou-as com um atilho. Meteu-se a caminho pela estrada da Boa Nova. A estrada estava longe de ser alcatroada. Forçosamente, tinha que passar frente ao cemitério. Não havia outro caminho. Nem uma simples vereda. Quando passava mesmo em frente à porta do cemitério, começou a ouvir um som, do tipo, tac, tac, tac. Desconfiado, olhava para trás mas não via nada. Mais desconfiado ficava. Começou a andar mais depressa, mas quanto mais depressa andava, mais repetidamente o som se ouvia devido ao maior número de boletas que caiam.
Quando chegou a casa, ia com a cara toda rosada e cansado, pois era um homem alto, forte e com uma razoável barriga. Era natural que se cansasse mais facilmente. A mulher, ao vê-lo naquele estado perguntou-lhe:
– O que é que tens homem?
– Parece que viste um fantasma!
O Ti Gaspar, não era capaz de falar, tal foi o medo que apanhou. Quando se acalmou é que reparou que não trazia boletas nenhumas. Foi então que se apercebeu que o receio era proveniente do som das boletas que caiam das mangas da jaqueta, pois tinham ficado mal atadas.
Luís de Matos

O Meu Passeio às Baleias no Mar dos Açores

Foto: Golfinhos-Açores - Luís de Matos
Estava um dia de sol de verão e a temperatura amena.
O avô resolveu levar o neto a dar um passeio à beira mar.
Sentaram-se os dois a descansar num daqueles bancos existentes na avenida, olhando o mar, as gaivotas esvoaçando rente à água e os barcos atracados no porto.
- Avô, avô, quero ir ver as baleias. Dizem que há tantas, tantas, ali...
- Ali? Onde?
- Sim, ali, e o Duarte, com o seu pequeno dedo, apontava na direcção do mar.
Então o avô, sentiu-se na obrigação de explicar que não são assim tantas como ele pensa. Mas antes de passar a essa explicação, o avô tentou acalmar o ímpeto da criança, dizendo-lhe:
- Sim está bem, qualquer dia vamos ver as Baleias.
- Boa, boa... eh, eh, eh...
- Sabes, até acerca de trinta anos atrás, os homens capturavam as baleias, para poderem ganhar o sustento para as suas famílias. Era um trabalho, que fazia parte da vida tradicional das ilhas. Era muito perigoso. Vê tu, que os homens iam para o mar em pequenos barcos e levavam arpões nas mãos para pescar as baleias.
- Avô, mas o que eram os arpões?
- Então os arpões são um pau muito comprido e que na ponta tem uma farpa de ferro que os homens atiravam, espetavam nas baleias e estas morriam. Na outra extremidade tem presa uma corda e esta por sua vez ligada ao barco, para depois ser puxada para terra. Já viste o que elas, coitadas, sofriam? Felizmente que hoje em dia os arpões foram substituídos por máquinas fotográficas digitais, que os turistas não se cansam de carregar o dedo no botão de disparo, fazendo bonitas e belas fotografias.
- Bom, mas deixa-me lá continuar. Depois as baleias começaram a ser menos, e os governantes tiveram que proibir a sua captura, para não se extinguirem. Mas os homens têm que continuar a ganhar dinheiro para a sua alimentação e das suas famílias. E assim, os homens que antes pescavam as baleias, começaram a empregar os seus conhecimentos do mar e das baleias na vigilância e na sua conservação. Hoje em dia, existe uma actividade de observação destes cetáceos que veio substituir a caça por uma maneira pacífica de apreciar estes animais no seu habitat natural. Como sabes existe uma ilha chamada ilha do Pico. Os homens dessa ilha eram os que pescavam mais baleias, e quase iam acabando com elas, como já te disse. Também existem em grande número nas Ilhas de S. Miguel e do Faial. Então, esses homens, tomaram consciência do seu erro, abandonaram a captura desses animais e dedicaram-se a essa tradição de forma pacífica. Até criaram um museu. Vê tu bem. Que ideia tão boa! Não achas?
- Sim, isso é bom, respondeu o Duarte muito entusiasmado com a conversa.
- Pois é. Nesse museu, e noutros locais, existem referências a todos esses animais. Até dos dentes e dos ossos das baleias, os pescadores fizeram bonitas peças de artesanato, representando cenas sobre a captura desses grandes animais. Como sabes são muito grandes. Por exemplo: as crias quando nascem têm cerca de quatro metros e pesam muitos quilos. Quase mil. Dá para imaginares esses quilos todos? Bom, com o tempo vais aprender.
- Bem... sei que devem ser muitos...
- Sim, são muitos. Mas continuando. As baleias dão de mamar aos filhos, e só ao fim de um ano de vida começam a ingerir alimentos sólidos, mas podem continuar a mamar até aos 4 ou 5 anos. Nadam a uma profundidade muito grande e comem muitos quilos de peixe. Podem beber cerca de vinte litros de leite por dia. Já viste? É muito leite, não é?
- Sim. - Respondia o Duarte um pouco confuso, com todos estes números.
- Sabes que os machos, tornam-se sexualmente activos entre os 18 e os 20 anos e medem nessa altura, 12 ou 13 metros? Mas continuam a crescer até aos quarenta metros. As fêmeas, ou seja, as baleias tornam-se sexualmente activas entre os 4 e os 9 anos de idade, e medem oito ou nove metros. Há ainda outra questão, não menos importante do que te acabo de explicar, que são as ameaças ao habitat natural das baleias. Esta ameaça está relacionada com o aquecimento global, a poluição e o buraco da camada de ozono. Noutros países, onde o aumento da pesca industrial é muito grande, contribui para a diminuição da alimentação das baleias. Por vezes ficam presas nas redes, o que também contribui para a sua extinção.
- Ó avô, falaste em buraco do ozono. O que é isso? É que eu ainda sou muito pequeno. Não percebo.
- É normal. Um dia irás perceber. Mas, entretanto, vou tentar explicar-te, à minha maneira, porque eu também não sou especialista na matéria, e isto é muito complicado. Como sabes, existem homens que estudam este fenómeno, que afecta todo o Planeta. E se o homem não toma medidas urgentes, é a nossa própria sobrevivência que está em causa. O ozono é uma molécula constituída por três átomos de oxigénio, que tem a particularidade de absorver a radiação ultravioleta proveniente do sol, actuando como um filtro para proteger os seres vivos da radiação ultravioleta.
- E o que são ultravioletas? São algumas flores?
- Não deixa-me continuar, que irás perceber. Como ia dizendo, estas radiações, desde que sejam em pequenas quantidades, são úteis à vida, como por exemplo, as plantas. Mas a exposição prolongada ao sol, faz muito mal. Por exemplo; quando vais à praia não te podes expor muito tempo ao sol, para não te queimares. Se não tiveres cuidado com o sol, podes sofrer consequências ao fim de alguns anos, como o envelhecimento da pele, e o que é mais grave e mais temido, é o cancro da pele. Sabes isso, não sabes? É por isso, que os teus pais te põem um creme protector e vestes uma camisola, para não apanhares sol directamente na pele. A destruição da camada de ozono, leva ao aumento de raios ultravioletas. Portanto, quando estes raios atingem a terra provocam problemas também ao nível dos ecossistemas marinhos. Esta é uma das razões porque há menos baleias e golfinhos. Mas não só. Outra razão são os lixos tóxicos, os químicos que por vezes as fábricas, por descuido ou maldade dos homens, lançam nas águas dos rios e ribeiros, que depois correm para o mar, ou são deitados directamente no mar. Por vezes acontecem grandes catástrofes, como o derramamento do petróleo no mar e nas praias. Outras vezes, são feitas lavagens dos porões dos navios em alto mar, onde depois lançam os produtos químicos e águas contaminadas. Tudo isto acontece pela acção directa do homem, prejudicando e acabando com a vida desses maravilhosos animais. Percebeste?
- Mais ou menos. Respondeu o Duarte, coçando a cabeça, como quem não está muito convencido da explicação acabada de ouvir.
Por sua vez, o avô notando a reacção do Duarte, disse-lhe:
- Bom, mas um dia, vais perceber isto melhor... Ai este miúdo! Actualmente, podemos observar os cetáceos em diversos tipos de barcos, propriedade de empresas que se dedicam à observação das baleias e dos golfinhos. Os profissionais destas empresas, tomaram uma consciência tão grande que impedem a perturbação destes mamíferos e contribuem para uma sã convivência entre o homem e a baleia. Uma das regras é desligar os motores dos barcos na presença dos cetáceos a uma distância de cinquenta metros e não se pode estar no local mais de trinta minutos. Actualmente e cada vez mais, estes cetáceos continuam presentes na vida do povo açoreano, através de uma forma mais sublime e dignificante.
- Ó avô, o que são os cetáceos?
- Bom, estava a ver que não tinhas dúvidas. Já há bocado tinha empregado esta palavra e não me perguntaste. Mas eu digo-te. Há diversos tipos de cetáceos, como as baleias e os golfinhos. Existem de várias dimensões, sendo que o golfinho é o mais pequeno com cerca de dois metros. O maior é a baleia azul que mede em média vinte a vinte e cinco metros de comprimento, sendo considerado o maior animal existente na terra. Há muitas espécies de golfinhos e de baleias.
- Só para teres uma ideia, queres que te diga alguns nomes?
- Sim, quero aprender, diz-me lá.
- Então escuta com atenção. Por exemplo; há o golfinho riscado, golfinho pintado, golfinho de bico comprido, golfinho comum, golfinho grampo e golfinho roaz. Quanto às baleias; existe a baleia azul, a baleia piloto, baleia bico-de-garrafa, baleia bico de pato, baleia anã, baleia comum, baleia de bossas, baleia boreal, cachalote, eu sei lá...Há muitas espécies. Mas é o cachalote que tu mais podes ver aqui na tua terra, os Açores. Estou cá a pensar, que amanhã podemos ir ver as baleias.
- Boa, boa, avô. Ai que bom, ai que bom...
E assim foi. Partimos para Vila Franca do Campo, para contactar uma daquelas empresas que agora se dedicam a mostrar as baleias aos turistas. Antes de partirmos para o mar para irmos ver as baleias, tivemos uma sessão explicativa durante alguns minutos, para que os participantes saibam o que vão ver e como vai decorrer a viagem. Vestimos coletes salva-vidas. Em terra existem os vigias, colocados em pontos estratégicos e de boa visibilidade, que dão as coordenadas via rádio para as embarcações. No nosso caso, o barco onde íamos, era um semi-rígido de 8 ou 10 metros de comprimento e levava 10 ou 12 pessoas. Partimos, portanto, de Vila Franca do Campo em direcção a sudoeste. Fizemos uma diagonal, na direcção de Ponta Delgada, mas para o mar alto. Ao fim de meia hora, avistámos um grupo de golfinhos e cachalotes, que nadavam a uma velocidade incrível, saltando aqui e acolá. Os golfinhos nadavam mais perto do barco. Foi o delírio do Duarte.
- Olha ali, olha ali, gritava o Duarte.
- E com o seu pequeno dedo, apontava na direcção da tartaruga, que ali estava sozinha no mar alto. Sabe-se lá de onde vinha e para onde ia o pobre animal.
- Eu quero apanhá-la, eu quero...
- Não. Não se pode. Nem somos capazes de o fazer. Mas mesmo que fossemos, não o devemos fazer. Foi assim, que os homens foram acabando com estes fantásticos animais. Depois voltamos a fazer outra diagonal e voltamos para Vila Franca do Campo, circundámos o Ilhéu de Vila Franca, que dista mil metros da costa. É um local maravilhoso, classificado como reserva natural.
E assim, o Duarte passou um dia inesquecível, fazendo amigos impossíveis de lhes tocar, a não ser algum dia num daqueles parques de diversões, onde os golfinhos nadam, saltam e vêm à borda do tanque beijar as crianças.
Luís de Matos
17/08/2008