sábado, 31 de janeiro de 2009

TI ZÉ DE MESTRE FERNANDES

Foto: castelo de Juromenha -Luís de Matos
Ali pró lado da estrada de Juromenha existe uma herdade que se chama “Mestre Fernandes”. Há muitos anos era Guarda dessa herdade o ti Zé de Mestre Fernandes. Não se lhe conhecia outro nome. Era assim que era conhecido pelas vilas e aldeias das redondezas. Mas este homem tinha uma particularidade muito especial. Era um exímio lutador de varapau e era também um homem alto e forte, com um corpanzil fora do comum.
Antigamente, sempre que em determinado local existisse um homem com determinadas características de brigões, velhacos, fortes, sabichões e outros atributos, a sua fama corria mundo. Então, logo apareceria outro homem que queria ser melhor que o outro e tratava de o procurar, fosse lá onde fosse para o desafiar.
Um belo dia, o ti Zé de Mestre Fernandes, vinha pelo caminho, entregue aos seus pensamentos, munido do seu inseparável varapau e saiu-lhe ao caminho um dos tais para o desafiar prá luta.
O ti Zé de Mestre Fernandes disse para consigo. Queres lá ver! O que é que este franganote quer de mim, tal era a fraca figura que lhe tinha saído ao caminho. Só que o tal franganote ou fraca figura, era um exímio lutador com o seu pequeno canivete a contrastar com o varapau do ti Zé de Mestre Fernandes. Os dois homens iniciaram uma aguerrida luta. Cada vez que o ti Zé de Mestre Fernandes desferia uma paulada nunca acertava no pequeno homem, pois este esquivava-se sempre e cada salto que dava, com o seu pequeno canivete, arrancava-lhe um botão da jaqueta. A luta continuava renhida ao ponto do ti Zé de Mestre Fernandes já não ter botões na jaqueta . Lembrou-se então que só o poderia vencer à traição e pregou um grito! Ó Manel! Ainda bem que apareces. Acode-me aqui, senão este malandro mata-me. Foi então que o pequeno homem olhou para trás, o ti Zé de Mestre Fernandes aproveitando a distracção do adversário desferiu-lhe uma paulada e só assim é que o conseguiu vencer.
Luís de Matos

O MISTÉRIO DO CÂNTARO DA ÁGUA



Um dia, no Centro Cultural das Hortinhas, à conversa com o ti António Francisco Duarte Dias, mais conhecido por ti António Marono, natural e residente em Hortinhas disse-me que, na década de cinquenta, quando tinha 22 anos foi de carreiro para o monte dos Vecentis, fica ali perto de Terena. Conhece? Claro que conheço, ti António. Então quer lá vêri. Vou-lhe contar uma:
Um dia, estava eu em cima do gargalo daquele poço que fica à roda do rebêro, a tirari água com um caldêro para encher a pipa. Era eu um rapagão. Andava o “Zidoro Guimar” mais o “Pádri Sardinhêro”. António Silva, de seu nome próprio, disse-lhe eu. Esse mesmo. Acho qu’era assim que se chamava. pois. Mas continuando. Andavam a cavári à roda duma azenhêra, prá arrancári.
Diz o “Pádri Sardenhêro”:
– Fujam c’azênhêra vai cairi.
Mas disse aquilo só pra m’assustári. Naqueles tempos difíceis, em que quase não havia trabalho, os homens tinham que puxar pela cabeça para arranjar formas de sobrevivência da família. Ora, o Pádri Sardenhêro, que tinha uns poucos de filhos, não passavam nada bem, o que era normal na época. Então tinha um meloal lá no Monte Inverno, que fica bem perto do Monte dos Vecentis. Se a colhêta fosse boa, sempre dava fartura prá casa e até podia fazer uns tostões pró pão, pagar na mercearia e para beber uns copitos na taberna do Manitas ou do ti Henrique Góis. Vai daí, um dia encontrei-o. Já tinha bebido um copo a mais, vira-se pra mim e, arrastando a voz disse-me:
– Lá no Monte dos Vecentis, ê livrê-te da mórti, (lembrou-se daquela brincadeira da azinheira) mas agora acabo contigo.
– E queria mandar-me pra dentro do poço.
Foi cá uma carga de trabalhos pró convencêri a não fazer aquela asnêra. E de que manêra, pois eu é que pagava as favas ca minha vida.
Pensei pra comigo. Entã nã queres lá veri! O cabrão do padre, (no bom sentido) está com os copos e estou metido numa carga de trabalhos. É qu’ele era implicanti como o caráaaaças. Quando se lhe metia uma coisa na cabeça… Estava a vêri a coisa um pouco feia.
– Deixe-se lá disso, vá lá mas é a vêri do meloal. Olhe q’as lebres comem-lhe os melões, ti Pádri.
Lá o convenci, mas fez-me cá apanhar um calôri! Sim senhori, essa é qué essa.
Quer ver outra dêli?
Claro, ti António, estamos aqui para isso.
O Pádri Sardenhêro, era uma pessoa munnnto engraçada e intligennnti. Nessa época havia fómi. Ainda hoji é conhecida como a época da fómi. E, atã o “Pádri Sardenhêro”, agarrava num cântaro de barro e dezia qu’ ia buscar água, mas era só pra despistári a Guarda. É que nessa época, a Guarda andava em cima dos póbris. Ele trazia-o mas era cheio de favas pra dar de comêri ós filhos. Ora, isto nã lembrava nem ó diabo. Só poderia sair duma pessoa intligenti c´mó Pádri Sardenhêro porqu’ era realmenti uma pessoa munnnto esperta. A necessidadi é mestra d’ engenhos nã é?Claro que é ti António.
Luís de Matos